Opinião Livro

Jesusalém, Mia Couto


Título Original: Jesusalém
Autor: Mia Couto
Editora: Editorial Caminho
Género: Romance
Páginas: 296
Ano Publicação PT: 2012
ISBN: 9789722126052

Sinopse

Jesusalém é seguramente a mais madura e mais conseguida obra de um escritor em plena posse das suas capacidades criativas. Aliando uma narrativa a um tempo complexa e aliciante ao seu estilo poético tão pessoal, Mia Couto confirma o lugar cimeiro de que goza nas literaturas de língua portuguesa. A vida é demasiado preciosa para ser esbanjada num mundo desencantado, diz um dos protagonistas deste romance. A prosa mágica do escritor moçambicano ajuda, certamente, a reencantar este nosso mundo.
António-Pedro Vasconcelos



Tinha alguma curiosidade neste livro depois de uma colega o ter recomendado e falado tão bem dele. Foi o primeiro que li de Mia Couto e gostei bastante do mundo que construiu. Mas também tive alguma dificuldade em me deixar absorver completamente pela história.

Narrado por Mwanito, um raparinho de 11 anos que vive em Jesusálem com o pai e o irmão mais velho e ainda o militar Zacarias. Sabe que não nasceu ali mas apenas conhece aquele mundo como sendo o seu sem ter qualquer ligação à cidade onde outrora viveu com a família e onde se separou pela última vez de sua mãe. O pai Silvestre Vitalício tomou em tempos a decisão de abandonar tudo e todos e construir um mundo à sua imagem, onde só as suas opcções estão correctas e ali estariam todos em segurança. Deixaria para trás a dor da perda da mulher Dordalma e os filhos estariam livres de todas as maldades, pecados e conspirações que lhes podiam poluir a alma se permanecem-se naquela cidade.


O mundo do Lado de lá não existia e eles eram os únicos sobreviventes. Apesar do sofrimento e ira que seu pai sentia e que começava a notar no irmão Ntunzi, conseguia ser feliz com os seus silêncios. Para ele não existia outro mundo senão aquele, onde o rio e toda a área controlada pela tabuleta de Jesusálem, não deviam ser transpostos nem sequer questionados. Contudo para o irmão era mais complicado, ele teve acesso ao mundo exterior, sabia como era a cidade, o que eram as mulheres, como era a vida deles antes. Por isso, foi através dele que começou a imaginar a mãe, começou a escrevinhar nas cartas, a ir até ao rio e a questionar o que haveria para lá. Tudo isto sem que o pai tivesse a oportunidade de desconfiar, mas a presença do Tio Aproximado, que trazia sempre que possível os carregamentos para que não morressem, também ajudava a atiçar a curiosidade.
  
A personagem Silvestre Vitalício é difícil de sentir simpatia mas depois de ser descodificada a verdadeira razão, percebemos que é um homem frustrado e culpado, uma alma presa ao sofrimento e deposita uma total esperança no isolamento do mundo, para tentar acalmar os demónios que pairam no seu espírito atormentado. Não é a melhor opcção mas aquela que achou que os salvaria dos desgostos que o mundo dá. Só que essa decisão implicou que os filhos fossem privados dos restantes regozijos que a vida também dá. E Ntunzi sente na pele as consequências dessa privação, mas Mwanito quando conhece o novo mundo sente-se mais perdido do que nunca. Afinal, aquilo que ele sempre conheceu foi aquele pedaço de terra chamado Jesusálem.  Não é mais do que o sítio possível de encontrar a paz e o afinar os silêncios.

 

Acho que esta é a mensagem que o autor quis passar, por mais que os pais queiram proteger os filhos do mundo, é uma tarefa impossível. Ninguém deve ser privado de nada por muito que o outro ache que seja o melhor. Nunca será melhor quando impomos a nossa vontade a outrem. E a vida pode nos dar muitos dissabores mas afinal de contas são eles que nos farão viver e apreciá-la.

Gostei da maneira engraçada como Mia Couto usa as palavras, dá um sentido ao texto ao fazer uns trocadilhos, o título assim como o nome de Dordalma são alguns dos exemplos. Mas sinto que preciso de ler mais qualquer coisa deste autor para entender a sua essência e poder apreciar melhor a sua plenitude.

Citações:

"Não é segurando nas assas que se ajuda um pássaro a voar. O pássaro voa simplesmente porque o deixam ser pássaro."

" Vida só sucede quando deixamos de a entender."

"Eis a lição que aprendi em Jesusálem: a vida não foi feita para ser pouca e breve. E o mundo não foi feito para ter medida."

Classificação: 3,5 de 5*

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